A INIBIDORA
À minha frente, sobre a secretária, lá está ela!
Parece meio adormecida ou mesmo fingindo-se desinteressada, porém eu sei que me está observando, atenta a todos os meus movimentos.
Mas eu não a olho directamente. Também não quero dar parte de fraco e por isso miro-a de viés ou, pretendendo que me pense igualmente desin-teressado, fixo o quadro pendurado por sobre a mesa mantendo-a porém dentro do meu campo visual.
Nem o estrondo de uma porta fechada com força, ou o ladrar de um cão das redondezas lhe arranca qualquer movimento. É como se nada fosse!
Eu sei que ela está alerta, pronta e esperando que eu me movimente na sua direcção como sempre acontece.
Desta vez vou tentar outra aproximação; viro-lhe as costas devagar (talvez ela pense que me vou embora) e, convencido que ela já não me espera, dou meia volta com rapidez e vou para ela já pronto para começar.
Qual quê!? Nada sucede, nenhuma ideia me ocorre! Aquela folha de papel, branca, poisada sobre a secretária, completamente inerte, inibe-me! Sufoca-me!
Nada consigo escrever! Amanhã voltarei a tentar.