A CHEGADA
Cheguei à estação quando ainda faltavam quase vinte minutos para a chegada do comboio e poucas eram as pessoas que estavam na plataforma para além do chefe da estação e de um ou outro empregado vestido de azul, a farda da companhia.
O dia amanhecera frio sem vento e sem nuvens.
Levantei-me cedo. A custo!
Porque é que os comboios chegam sempre muito cedo?
Porquê essa pressa toda em chegar?
Não podiam chegar depois do almoço?
Ou à hora do lanche?
À minha pergunta o chefe da estação confirmou o atraso de meia hora o que mais me fez arrepender por me ter levantado tão cedo. Perdi, praticamente, uma hora de sono.
E agora? Não vou voltar a deitar-me ainda que muito o deseje.
Resta-me aguardar.
Lentamente a estação foi-se enchendo de gente, pessoas que, tal como eu, também vinham esperar outras pessoas. Senti algum prazer enquanto as ia informando do atraso na chegada, chegando ao exagero de acrescentar mais uns dez ou vinte minutos ao tempo real do atrazo, numa espécie de vingança sádica sobre pessoas que nem conhecia. Sei que foi uma parvoíce. Mas não consegui evitar e sempre aliviou o desconforto que sentia.
Passeei para lá e para cá enquanto os ponteiros passavam vagarosamente entre cada minuto do enorme relógio pendurado na parede da estação.
Ao longe um apito!
Já lá vem já lá vem!, gritam alguns miúdos correndo até ao final da plataforma da estação.
Já lá vinha, de facto!
Chegou soprando fumo e chocalhando ferros enquanto os travões gemiam numa agonia para, finalmente, se deter. Não sei quantas, mas acho que todas as portas se abriram e os passageiros saíram em fila, parecendo formigas saindo do formigueiro, carregando malas e mais malas, sacos e mochilas, electrodomésticos e carrinhos de bebé. Quase todos os rostos aparentavam sinais de cansaço que se amenizavam no abraço aos familiares e aos amigos que os esperavam.
Sem pressas foram saindo da estação em direcção à vila, conversando sobre a viagem contando as novidades de lá e também as de cá.
Olhei à volta e não restava ninguém! Até o comboio tinha abalado para outras paragens. Apesar de todas as promessas feitas, trocadas, repetidas, quem eu viera esperar não chegou. Fiquei parado, com o olhar fixo na linha que trouxera o comboio, alheado do que me rodeava, como se aquela não chegada tivesse absorvido todas as minhas ideias, vontades e actos.
Não me recordo como voltei para casa, mas voltei.
Sentado na sala penso, tentando encontrar uma justificação: atrasou-se e perdeu o comboio; decidiu vir de carro; decidiu vir amanhã…
Mas eu pressentia que não era assim. Decidiu não vir e eu sabia porquê.
Habituada como estava de viver num ritmo frenético e “fechada” numa cidade grande, este espaço aberto e livre das planícies a perder de vista, eram espaços a mais que a “esmagavam”.
Mas na cidade, entre casas e carros, ruas e avenidas, eu sufocava por falta de espaço…
Não voltei a falar-lhe. Nem ela esperava que eu o fizesse.
Ficámos assim como que parados no tempo, numa expectativa de um próximo encontro sabendo ambos que isso nunca acontecerá!